By Ana Beatriz Marin
Renomada escritora brasileira, Maria da Conceição Evaristo de Brito nasceu em Belo Horizonte, Minas Gerais, no dia 29 de novembro de 1946. É a segunda de nove irmãos – filhos da empregada doméstica Joana Josefina Evaristo e do pedreiro Antônio Evaristo –, que cresceram em meio à pobreza da favela do Pendura Saia. Esse universo familiar, composto também por tias que trabalhavam como cozinheiras e faxineiras, permeia toda a sua obra. Seus livros são marcados pela fusão de memórias pessoais, experiências coletivas, um olhar crítico para a marginalização da mulher e da comunidade negra e a ancestralidade. É reconhecida também por sua atuação como ativista social, promovendo debates sobre igualdade racial e de gênero e acesso à educação.
O interesse de Conceição Evaristo pela literatura começou ainda na infância. A mãe, mesmo sem saber ler, recolhia livros e revistas e os mostrava aos filhos. Juntos, viam as figuras e inventavam novas tramas, que traziam toda uma herança das culturas africanas de contação de histórias. Em paralelo, aos 12 anos, começou a trabalhar como empregada doméstica para ajudar a família. Aos 16 anos, entrou no Instituto de Educação de Minas Gerais, onde se graduou em Letras, em 1971.
Após se formar, passou a trabalhar como professora na rede pública de ensino do Rio de Janeiro, dando aulas de Português, Literatura e Redação por mais de 30 anos. Nesse período, começou a escrever seus primeiros poemas e contos. Seus textos foram publicados pela primeira vez nos anos 1990 na série “Cadernos Negros”, uma publicação literária que valoriza a literatura afro-brasileira.
A publicação do romance “Ponciá Vicêncio”, em 2003, marca o início de sua notável trajetória na literatura. Ele conta a história de uma mulher negra que é arrancada de sua terra natal e trazida para o Brasil como escrava. Também é autora, entre outros, de “Becos da Memória”, “Insubmissas Lágrimas de Mulheres”, “Histórias de Leves Enganos e Parecenças”, “Poemas da recordação e outros movimentos” e “Olhos d’água”, livro de contos com o qual ganhou o Prêmio Jabuti de Literatura na categoria Romance, em 2015. Os textos contam histórias de mulheres negras que vivem na periferia do Rio de Janeiro e abordam temas como pobreza, violência de gênero, a busca por identidade e a resistência do povo negro.
Em 2018, a escritora concorreu a uma vaga na Academia Brasileira de Letras (ABL). Apesar de ter recebido apenas um voto – o eleito foi o cineasta Cacá Diegues, com 22 – sua candidatura representou um marco na história da instituição. Conceição Evaristo foi a primeira mulher negra a disputar uma cadeira na ABL. Perguntada se se candidataria novamente, ela disse: “Particularmente, não tenho esse desejo porque acho que poderia ser uma perda de tempo. Se da outra vez ganhei um voto, agora, talvez levasse dois. Gosto de afirmar sem modéstia que quem perdeu não foi Conceição Evaristo, foi a Academia, que deixou de escrever na História da instituição um grande momento. Perderam também com a não eleição de Daniel Munduruku”, afirmou.
Em 2023, ela venceu o Troféu Juca Pato de Intelectual do Ano, concedido pela União Brasileira de Escritores, tornando-se a primeira mulher negra a recebê-lo. Criado em 1962 por iniciativa do escritor Marcos Rey, o troféu é um dos mais tradicionais do Brasil. Personalidades como Frei Betto, Lygia Fagundes Telles, Carlos Drummond de Andrade, Antonio Candido, Dalmo Dallari, Milton Hatoum, Ignácio de Loyola Brandão e Aílton Krenak, entre outros, são alguns nomes que já receberam o prêmio, que tem a democracia e resistência como base.
Em função de sua obra e de seu ativismo, Conceição Evaristo tornou-se referência para jovens autores negros. Para ela, a militância está intimamente ligada ao coletivo. “Sou formada dentro do compromisso com o entorno”, diz. Em meados dos anos 1980, por exemplo, junto a um coletivo de escritores negros, apresentou suas obras em escolas públicas, presídios e em associações de moradores. “Esse estar no coletivo é um estar que me formou. Nunca entro em conflito (com a literatura). O meu texto também é oriundo dessa palavra coletiva”, fala.
Em 2016, ela criticou a organização da maior feira literária do Brasil, a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), ao constatar a ausência de autores negros. “Estamos lendo uma nação incompleta”, comentou na ocasião. Em função disso, no ano seguinte, a festa homenageou o escritor Lima Barreto e aumentou a participação de escritores negros na programação nesta e nas edições subsequentes.
Sobre a autora:
Ana Beatriz Marin é uma jornalista multimídia com mais de 30 anos de experiência em diversos meios de comunicação: web, televisão, revistas, jornais e rádio. No Rio de Janeiro (Brasil), trabalhou nos jornais O Globo, Extra e O Dia como repórter, redatora e editora. Em 2021, foi coordenadora e produtora executiva de um projeto audiovisual para o Snapchat (Snap Group Limited) através da produtora espanhola Bad Cat Company. Viveu por sete anos e meio em Barcelona. Na capital catalã, trabalhou no jornal La Vanguardia como redatora e produtora de conteúdo em texto e vídeo. Também trabalhou na rede de televisão Telecinco, para o jornal L’Avui e para a Comissão Europeia.